A apropriação genuína da história passada e as estruturas constitutivas da vida fática segundo o Relatório-Natorp (1922), de Martin Heidegger

Autores

DOI:

https://doi.org/10.15448/1984-6746.2025.1.45966

Palavras-chave:

fenomenologia, ontologia, facticidade, vida fática

Resumo

O presente artigo comenta globalmente a primeira parte do Relatório-Natorp (conhecido como “Interpretações fenomenológicas sobre Aristóteles. Indicação da situação hermenêutica”), elaborado por Martin Heidegger, em 1922, com o objetivo de concorrer a uma vaga de professor de filosofia nas Universidades de Marburg e Göttingen. Do ponto de vista de seu caminho de pensamento, esta primeira parte retoma sua compreensão da fenomenologia da vida fática já declinada nas preleções friburguenses entre 1919 e 1922. Em sua “Introdução” à subsequente publicação do manuscrito do Relatório-Natorp (em 1989, no Dilthey Jahrbuch), após sua descoberta, Hans-Georg Gadamer o intitulou “O escrito ‘teológico’ juvenil de Heidegger”. Por quê? Porque a teologia cristã se move no interior de conceitos que se originaram na ontologia aristotélica. Heidegger procurou no Aristóteles não escolástico o que o fenômeno religioso do Cristianismo das origens era incapaz de fornecer: a clarificação e a determinação de um caminho genuíno de fazer filosofia. Neste escrito, há um prólogo sobre sua proposta radical: a filosofia é uma hermenêutica fenomenológica da facticidade. Nele, Heidegger esboçou suas interpretações filosóficas atuais e projetadas de Aristóteles. Elas estão a serviço da história da ontologia e da lógica sob fio condutor da situação hermenêutica. Neste sentido, Heidegger procurava conquistar uma direção genuína do olhar em seu interrogar originário. Considerando a densidade do Relatório-Natorp, que se insere no primeiro período friburguense da docência de Heidegger (1919-1923), eu me limitarei a destacar, primeiramente, os pressupostos de toda a interpretação no âmbito de uma ontologia da facticidade: (1); em segundo lugar, abordarei ora a gênese da chamada “situação hermenêutica” como expressão do si mesmo (Selbst), ora a recuperação da história passada com base no “histórico” (das Historische) imanente na pesquisa-questionante; por fim, analisarei as estruturas constitutivas da vida fática: o cuidar, a tendência para o ruir, o como do ter a morte (2).

Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

Bento Silva Santos, Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Vitória, Espírito Santo, Brasil.

É graduado em Teologia pelo Pontifício Ateneo de Santo Anselmo (Roma-Itália, 1987-1990), mestre em Teologia pela Pontifícia Universidade Gregoriana (Roma-Itália, 1991-1993); mestre (1996-1997) e doutor (1998-2001) em Filosofia pela PUC-RIO. Atualmente é professor titular do Departamento de Filosofia, membro permanente do Programa de Pós-Graduação em Filosofia (Mestrado-Doutorado) da Universidade Federal do Espírito Santo e bolsista de produtividade em pesquisa, nível 02, do CNPq desde 2009.

Referências

Obras citadas de Martin Heidegger (GA = Gesamtausgabe)

HEIDEGGER, M. Das Problem der Sünde bei Luther. In: JASPERT B. (ed). Sachgemässe Exegese. Die Protokolle aus Rudolf Bultmanns Neutestamentlichen Seminaren, 1921-1951. Marburg: Elwert, 1996. p. 28-33 (trad. francesa e notas de Christian Sommer: Le problème du péché chez Luther (1924). In: ARRIEN, S.-J. ; CAMILLERI, S. (éd.). Le jeune Heidegger 1909-1926. Paris: J. Vrin, 2011). (Heidegger, 2011; ver, infra, Sommer, 2011).

HEIDEGGER, M. Die Grundbegriffe der antiken Philosophie (SS 1926) (GA 22). Frankfurt am Main: Vittorio Klostermann, 1993 (trad. italiana: I concetti fondamentali dela filosofia antica (GA 22). Milano: Adelphi, 2000. (= Heidegger, 2000).

HEIDEGGER, M. Die Grundprobleme der Phänomenologie [Sommersemester 1927] (GA 24). Frankfurt am Main: Vittorio Klostermann, 1975 (3 1997). (= Heidegger, 1975)

HEIDEGGER, M. Einführung in die Phänomenologie Forschung [WS 1923/1924] (GA 17). Frankfurt am Main: Vittorio Klostermann, 1994 (2 2006). (= Heidegger, 1994).

HEIDEGGER, M. Exercices sur Aristote, De Anima (semestre d’été 1921). Trad. de Sylvain Camilleri e Christophe Perrin. In: ARRIEN, S.-J.; CAMILLERI, S. (éd.). Le jeune Heidegger 1909-1926. Paris: J. Vrin, 2011a. p. 239- 257. (= Heidegger, 2011a).

HEIDEGGER, M. Grundbegriffe der aristotelischen Philosophie [Sommersemester 1924] (GA 18). Frankfurt am Main: Vittorio Klostermann, 2002. (= Heidegger, 2002).

HEIDEGGER, M. Grundprobleme der Phänomenologie [WS 1919/20] (GA 58). Frankfurt am Main: Vittorio Klostermann, 1993 (2 2010). (= Heidegger, 1993).

HEIDEGGER, M. Le problème du péché chez Luther (1924). In: ARRIEN, S.-J. ; CAMILLERI, S. (éd.). Le jeune Heidegger 1909-1926, 259-264 (com as notas de Christian Sommer, p. 265-286). Paris: J. Vrin, 2011b. (= Heidegger, 2011b).

HEIDEGGER, M. Ontologie. (Hermeneutik der Faktizität) [SS 1923] (GA 63). Frankfurt am Main: Vittorio Klostermann, 1988 (3 2018). (= Heidegger, 1988).

HEIDEGGER, M. Phänomenologie des religiösen Lebens (GA 60). 1. Einleitung in die Phänomenologie der Religion [WS 1920/1921]. 2. Augustinus und Neuplatonismus (SS 1921). 3. Die philosophischen Grundlagen der mittelalterlichen Mystik (1918/1919). Frankfurt am Main: Vittorio Klostermann, 1995 (2 2011). (= Heidegger, 1995).

HEIDEGGER, M. Phänomenologische Interpretationen ausgewählter Abhandlungen des Aristoteles zu Ontologie und Logik, [Sommersemester 1922] (GA 62). Vittorio Klostermann: Frankfurt am Main 2005a. p. 1-339. (= Heidegger, 2005a).

HEIDEGGER, M. Phänomenologische Interpretationen zu Aristoteles. Einführung in die phänomenologische Forschung [WS 1921/1922] (GA 61). Frankfurt am Main: Vittorio Klostermann, 1985 (2 1994). (= Heidegger, 1985).

HEIDEGGER, M. Phänomenologische Interpretationen zu Aristoteles. (Anzeige der hermeneutischen Situation). In: DILTHEY-JAHRBUCH 6. 1989. p. 236-274 (1 = primeira publicação do chamado Natorp-Bericht) (= Heidegger, 1989); Phänomenologische Interpretationen zu Aristoteles. Ausarbeitung für die Marburger und die Göttinger Philosophische Fakultät (1922), hrsg. v. G. Neumann, Stuttgart: Reclam, 2003 (2 = segunda publicação do Natorp-Bericht); Phänomenologische Interpretationen zu Aristoteles. Ausarbeitung für die Marburger und die Göttinger Philosophische Fakultät (1922), In: Phänomenologische Interpretationen ausgewählter Abhandlungen des Aristoteles zu Ontologie und Logik, Frühe Freiburger Vorlesung [Sommersemester 1922] (GA 62). Vittorio Klostermann: Frankfurt am Main 2005b. p. 341-419 (3 = terceira publicação e última versão do Natorp-Bericht. (= Heidegger, 2005b).

HEIDEGGER, M. Platon: Sophistes (Wintersemester 1924/25). (GA19). Frankfurt am Main: Vittorio Klostermann, 1992 (2 2018). (= Heidegger, 1992).

HEIDEGGER, M. Prolegomena zur Geschichte des Zeitbegriffs [SS 1925] (GA 20). Frankfurt am Main: Vittorio Klostermann, 1979. (= Heidegger, 1979).

HEIDEGGER, M. Ser e Tempo. Edição em alemão e português. Tradução, organização, nota prévia, anexos e notas por Fausto Castilho. São Paulo: Unicamp; Petrópolis: Vozes, 2012. p. 193/541 (original/tradução, respectivamente). Tradução modificada. (= Heidegger, 2012).

LITERATURA SECUNDÁRIA

ARDOVINO, A. Heidegger. Esistenza ed effettività. Dall’ermeneutica dell’effettività all’analitica esistenziale (1919-1929). Milano: Guerini e Associati, 1998.

ARRIEN, S.-J. ; CAMILLERI, S. (éd.). Le jeune Heidegger 1909-1926. Paris: J. Vrin, 2011.

BROGAN, W. The Place of Aristotle in the Development of Heidegger’s Phenomenology. In: KISIEL, T. ; VAN BUREN, J. (ed.). Reading Heidegger from the Start: Essays in His Earliest Thought. Albany: State University of New York Press, 1994. p. 213-227.

CAMPBELL, S. M. The Early Heidegger’s Philosophy of Life. Facticity, Being, and Language. New York: Fordham University Press, 2012. DOI: https://doi.org/10.5422/fordham/9780823242191.001.0001

CAPUTO, A. Pensiero e affettività: Heidegger e le Stimmungen (1889-1928). Milano: Franco Angeli, 2001.

CIOCAN, C. La genèse du problème de la morte avant Être et Temps. In: ARRIEN, S.-J. ; CAMILLERI, S. (éd.). Le jeune Heidegger 1909-1926. Paris: J. Vrin, 2011. p. 213-237.

HUSSERL, E. Logische Untersuchungen. In: HUSSERLIANA: Edmund Husserl Gesammelte Werke. XIX/1 e 2. Ed. U. Panzer. Den Haag-Dordrecht-Boston: Martinus Nijhoff, 1984. DOI: https://doi.org/10.1007/978-94-009-6068-8

HUSSERL, E. Vorlesungen über Bedeutungslehre. Sommersemester 1908. In: HUSSERLIANA XXVI. Ed. U. Panzer. Den Haag-Dordrecht-Boston: Martinus Nijhoff, 1987.

OREJARENA TORRES, J. Trascendentalidad, destrucción y cuidado: Heidegger y la apropriacíon de la o] rexi” aristotélica. In: XOLOCOTZI YÁÑEZ, A.; GIBU, R.; OREJARENA TORRES, J. (coord.). Aristóteles y la fenomenología del siglo XX: estudios en torno a la presencia de Aristóteles en la obra de Heidegger y Husserl. Buenos Aires: Biblos, 2022. p. 347-390.

PERRIN, C. Heidegger et l’être du On. Bulletin d’Analyse Phénoménologique, Liège, v. IV, n. 4, 2008a.

PERRIN, C. Heidegger et l’histoire du On, Bulletin d’Analyse Phénoménologique. Liège, v. IV, n. 8, 2008b.

QUESNE, P. Les Recherches philosophiques du jeune Heidegger. Dordrecht: Kluwer Academic Publishers, 2003.

REINACH, A. Phénoménologie réaliste. Trad. sob a direção de Dominique Pradelle. Paris: J. Vrin, 2012.

SILVA SANTOS, Bento. A fenomenologia hermenêutica da vida fática de Martin Heidegger (1919-1923). São Paulo: LiberArs, 2023.

SOMMER, C. Heidegger, Aristote, Luther. Paris: PUF, 2005. DOI: https://doi.org/10.3917/puf.somme.2005.01

SOMMER, C. Notes à exposição de Martin Heidegger (= Le problème du péché chez Luther) dada no Seminário de Rudolf Bultmann (Die Ethik des Paulus) aos 14 e 21 de fevereiro de 1924. In: ARRIEN, S.-J.; CAMILLERI, S. (éd.). Le jeune Heidegger 1909-1926. Paris: J. Vrin, 2011. p. 265-286.

SURACE, V. L’ inquietudine dell’esistenza. Le radici luterane dell’ontologia della vita di Martin Heidegger. Milano: Mimesis, 2014.

VIGO, A. G. Sýnthesis y diaíresis: un motivo aristotélico en las teorías fenomenológicas del juicio de Husserl y Heidegger. In: XOLOCOTZI YÁÑEZ, A.; GIBU, R.; OREJARENA TORRES, J. (coord.). Aristóteles y la fenomenología del siglo XX: estudios en torno a la presencia de Aristóteles en la obra de Heidegger y Husserl. Buenos Aires: Biblos, 2022. p. 117-161.

VOLPI, F. Dasein comme praxis: L’assinilation et la radicalisation heideggerienne de la philosophie pratique d’Aristote. In: VOLPI, F.; MATTÉI, J.-F. et al. Heidegger et l’idée de la phénoménologie. Dordrecht-Boston-London: Kluwer Academic Publishers, 1988. p. 1-41.

VOLPI, F. Introduzione del Curatore. In: HEIDEGGER, M. Die Grundbegriffe der antiken Philosophie (SS 1926) (GA 22). Frankfurt am Main: Vittorio Klostermann, 1993 (trad. italiana: I concetti fondamentali dela filosofia antica (GA 22). Milano: Adelphi, 2000.

WU, R. O léxico da salvaguarda em Heidegger. Síntese: revista de filosofía, Belo Horizonte, v. 40, n. 155, p. 471-493, 2022. DOI: https://doi.org/10.20911/21769389v49n155p471/2022

WU, R. Resenha: Bento Silva Santos. A Fenomenologia hermenêutica da vida fática de Martin Heidegger (1919- 1923). Sofia, Vitória, v. 14, n. 1, e14147527, 2025. DOI: https://doi.org/10.47456/sofia.v14i1.47527

Downloads

Publicado

2025-06-10

Como Citar

Silva Santos, B. (2025). A apropriação genuína da história passada e as estruturas constitutivas da vida fática segundo o Relatório-Natorp (1922), de Martin Heidegger. Veritas (Porto Alegre), 70(1), e45966. https://doi.org/10.15448/1984-6746.2025.1.45966