Do berço colonial à dinâmica não linear

O despertar da percepção da fala nos estudos em fonologia

Autores

DOI:

https://doi.org/10.15448/1984-4301.2022.1.42641

Palavras-chave:

fonologia, percepção da fala, complexidade

Resumo

Embora saibamos que a percepção da fala desempenha papel central no desenvolvimento linguístico, sua adoção na teoria fonológica enfrentou resistência teórica e metodológico-tecnológica. Todavia, o interesse pela área tem aumentado por dois motivos principais: o avanço tecnológico das ciências da fala e as tentativas de incorporação de princípios perceptuais a modelos fonológicos tradicionais. Neste artigo, advogamos que o despertar tardio da percepção na fonologia está relacionado ao seu berço colonial e, como consequência, ao modo como algumas teorias/modelos linguísticos cartesianos enxergam e validam o indivíduo e o individual e, por conseguinte, a produção e a percepção da fala, construtos que, em modelos clássicos de fonologia, não se inserem nas definições de língua. A marginalização da percepção está relacionada ao “epistemicídio” (SANTOS, 2019, p. 28) provocado por paradigmas científicos (linguísticos) hegemônicos que tiveram o suporte da privilegiada ciência moderna. Logo, neste trabalho, pretendemos descolonizar a fonologia, fundamentando-nos em uma proposta científica calcada na Complexidade, trazendo à tona uma leitura crítica da dicotomia langue-parole. Na perspectiva adotada neste texto, a gramática fonológica é orientada pelas ações individuais de superfície, e a percepção de suas unidades fônicas torna-se primordial para que seja instanciada.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

Reiner Vinicius Perozzo, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, RS, Brasil.

Doutor em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em Porto Alegre, RS, Brasil. Professor no Departamento de Línguas Modernas do Instituto de Letras da mesma universidade.

Felipe Flores Kupske, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, RS, Brasil.

Doutor em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em Porto Alegre, RS, Brasil. Professor do Departamento de Línguas Modernas da UFRGS e professor permanente do Programa de Pós-Graduação em Língua e Cultura (PPGLinC) da Universidade Federal da Bahia (UFBA), em Salvador, BA, Brasil. Líder do Laboratório de Ciências da Fala (LAFALA).

Referências

ALBANO, E. O gesto e suas bordas: esboço de fonologia acústico-articulatória do português brasileiro. Campinas: Mercado de Letras, 2001.

ALBANO, E. O tear encantado: tecnologia, complexidade e imaginário interdisciplinar sobre a linguagem. Remate de Males, [S. l.], v. 29, n. 1, p. 41-57, 2009. Dossiê Tecnologia das Letras. DOI: https://doi.org/10.20396/remate.v29i1.8636287

ALBANO, E. O gesto audível: fonologia como pragmática. São Paulo: Cortez, 2020.

ASHBY, M.; MAIDMENT, J. Introducing phonetic science. Cambridge: Cambridge University Press, 2005. DOI: https://doi.org/10.1017/CBO9780511808852

BECKNER, C.; BLYTHE, R.; BYBEE, J.; CHRISTIANSEN, M. H.; CROFT, W.; ELLIS, N. C.; HOLLAND, J.; KE, J.; LARSEN-FREEMAN, D.; SCHOENEMANN, T. Language is a complex adaptive system: position paper. Language Learning, [S. l.], v. 59, p. 1-26, 2009. DOI: https://doi.org/10.1111/j.1467-9922.2009.00533.x

BERTICELLI, I. Educação em perspectivas epistemológicas pós-modernas. Chapecó: Editora Argos, 2010.

BOERSMA, P; WEENINK, D. Praat: doing phonetics by computer (programa computacional, versão 6.2.05). [S. l.]: Praat, 2022. Disponível em: http://www.praat.org. Acesso em: 2022.

BRESCANCINI, C.; GOMES, C. Fonética versus Fonologia? Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 49, p. 5-10, 2014. DOI: https://doi.org/10.15448/1984-7726.2014.1.17283

BROWMAN, C.; GOLDSTEIN, L. Towards an articulatory phonology. Phonology, [S. l.], v. 3, p. 219-252, 1986. DOI: https://doi.org/10.1017/S0952675700000658

BROWMAN, C.; GOLDSTEIN, L. Articulatory gestures as phonological units. Phonology, [S. l.], v. 6, p. 201-251, 1989. DOI: https://doi.org/10.1017/S0952675700001019

BROWMAN, C.; GOLDSTEIN, L. Articulatory phonology: An overview. Phonetica, [S. l.], v. 49, p. 155-180, 1992. DOI: https://doi.org/10.1159/000261913

BROWMAN, C.; GOLDSTEIN, L. Dynamics and articulatory phonology. Haskins Laboratories Status Report on Speech Research, [S. l.], SR-113, p. 51-62, 1993.

BYBEE, J. Phonology and language use. Cambridge: Cambridge University Press, 2001. DOI: https://doi.org/10.1017/CBO9780511612886

BYBEE, J. Language, usage and cognition. Cambridge: Cambridge University Press, 2010. DOI: https://doi.org/10.1017/CBO9780511750526

CHOMSKY, N. Syntactic structures. Cambridge: MIT Press, 1957. DOI: https://doi.org/10.1515/9783112316009

CHOMSKY, N.; HALLE, M. The sound pattern of English. Nova Iorque: Harper and Row, 1968.

CILLIERS, P. Complexity and postmodernism: Understanding complex systems. London: Routledge, 2002. DOI: https://doi.org/10.4324/9780203012253

COELHO, O.; FINBOW, T. Apontamentos para uma história linguística transatlântica e descolonizada do português no Brasil: o contato e a diversidade em foco. In: VIEIRA, F. E.; BAGNO, M. (org.). História das línguas, histórias da linguística: homenagem a Carlos Alberto Faraco. São Paulo: Parábola, 2020. p. 61-84.

COHN, A. Phonetics in phonology and phonology in phonetics. Working Papers of the Cornell Phonetics Laboratory, [S. l.], v. 16, p. 1-31, 2007.

CRISTÓFARO-SILVA, T.; GOMES, C. Fonologia na perspectiva dos modelos de exemplares. In: GOMES, C. (org.). Fonologia na perspectiva dos modelos de exemplares. São Paulo: Contexto, 2020. p. 13-36.

DE BOT, K.; LOWIE, W.; VERSPOOR, M. Introduction. In: VERSPOOR, M.; DE BOT, K.; LOWIE, W. (org.). A dynamic approach to second language development: methods and techniques. Amsterdã: John Benjamins Publishing Company, 2011. p. 1-4. DOI: https://doi.org/10.1075/lllt.29.00toc

FERREIRA-GONÇALVES, G.; KUPSKE, F. Um caso de opacidade fonológica na aquisição do PB: um problema ótimo ou uma questão exemplar? Leitura: Revista do Programa de Pós-Graduação em Letras (UFAL), [S. l.], v. 2, p. 125-148, 2010. DOI: https://doi.org/10.28998/0103-6858.2010v2n46p125-148

FOWLER, C. Coarticulation and theories of extrinsic timing control. Journal of Phonetics, [S. l.], v. 8, p. 113-133, 1980. DOI: https://doi.org/10.1016/S0095-4470(19)31446-9

FOWLER, C. An event approach to the study of speech perception from a direct-realist perspective. Journal of Phonetics, v. 14, p. 3-28, 1986. DOI: https://doi.org/10.1016/S0095-4470(19)30607-2

GOLDSTEIN, L.; FOWLER, C. Articulatory phonology: a phonology for public language use. In: MEYER, A.; SCHILLER, N. (org.). Phonetics and phonology in language comprehension and production: Differences and similarities. Berlim: Mouton de Gruyter, 2003. p. 159-207.

HAUGEN, E. The ecology of language. In: FILL, A; MÜHLHÄUSLER, P. (org.). The ecolinguistics reader. Londres: Continuum, 2001. p. 57-66.

HAYES, B. Phonetically driven phonology: The role of Optimality Theory and inductive grounding. In: DARNELL, M.; MORAVCSIK, E.; NOONAN, M.; NEWMEYER, F.; WHEATLEY, K. (org.). Functionalism and Formalism in Linguistics: Volume I: General papers. Amsterdã: John Benjamins, 1999. p. 243-286. DOI: https://doi.org/10.1075/slcs.41.13hay

HAYES, B.; STERIADE, D. Introduction: The phonetic bases of phonological markedness. In: HAYES, B.; KIRCHNER, R.; STERIADE, D. (org.). Phonetically based phonology. Cambridge: Cambridge University Press, 2004. p. 1-33. DOI: https://doi.org/10.1017/CBO9780511486401.001

HORN, J. Human research and Complexity Theory. Educational philosophy and theory, [S. l.], v. 40, n.1, p. 130-143, 2008. DOI: https://doi.org/10.1111/j.1469-5812.2007.00395.x

HUME, E.; JOHNSON, K. The role of speech perception in phonology. São Diego: Academic Press, 2001. DOI: https://doi.org/10.1163/9789004454095

JOOS, M. Acoustic phonetics. Language, [S. l.], v. 24, n. 2, 1948. DOI: https://doi.org/10.2307/522229

KEATING, P. The phonology-phonetics interface. In: NEWMEYER, F. (org.). The Cambridge linguistic survey: Linguistic theory: Foundations. Cambridge: Cambridge University Press, 1988. p. 281-302.

KENT, R.; READ, C. The acoustic analysis of speech. Londres: Cengage Learning, 1992.

KINGSTON, J. The phonetics-phonology interface. In: LACY, P. (org.). The Cambridge handbook of phonology. Cambridge: Cambridge University Press, 2007. p. 401-434. DOI: https://doi.org/10.1017/CBO9780511486371.018

KUPSKE, F. A complex approach on integrated late bilinguals’ English VOT production: a study on South Brazilian immigrants in London. Ilha do Desterro, [S. l.], v. 70, n. 3, p. 81-93, 2017. DOI: https://doi.org/10.5007/2175-8026.2017v70n3p81

KUPSKE, F. Destabilizing effects of L2 explicit pronunciation instruction on L1 speech: Voice Onset Time production by Brazilian intermediate users of English. Gradus: Revista Brasileira de Fonologia de Laboratório, [S. l.], v. 6, n. 2, p. 32-49, 2021. DOI: https://doi.org/10.47627/gradus.v6i2.174

KUPSKE, F.; PEROZZO, R.; ALVES, U. Sound change as a Complex Dynamic phenomenon and the blurriness of grammar stability. Macabéa: Revista Eletrônica do Netlli, v. 8, n. 2, p. 158-172, 2019. DOI: https://doi.org/10.47295/mren.v8i2.1966

LADD, R. Phonetics in phonology. In: GOLDSMITH, J.; RIGGLE, J.; YU, A. (org.). Handbook of phonological theory. Oxford: Blackwell Publishing, 2011. p. 348-373. DOI: https://doi.org/10.1002/9781444343069.ch11

LADEFOGED, P. A Course in Phonetics. Boston: Heinle & Heinle, 2001.

LARSEN-FREEMAN, D. Complexity theory: a new way to think. Revista Brasileira de Linguística Aplicada, [S. l.], v. 13, n. 2, p. 363-373, 2013. DOI: https://doi.org/10.1590/S1984-63982013000200002

LARSEN-FREEMAN, D. Complexity theory: the lessons continue. In: ORTEGA, L.; HAN, Z. (org.). Complexity theory and language development: in celebration of Diane Larsen-Freeman. Amsterdã: John Benjamins Publishing Company, 2017. p. 11-50. DOI: https://doi.org/10.1075/lllt.48.02lar

LEGENDRE, G.; MIYATA, Y.; SMOLENSKY, P. Can connectionism contribute to syntax? Harmonic Grammar, with an application. In: ZIOLKOWSKI, M.; NOSKE, M.; DEATON, K. (org.). Proceedings of the 26th Regional Meeting of the Chicago Linguistic Society. Chicago: Chicago Linguistic Society, 1990.

LIMA JR., R.; ALVES, U.; KUPSKE, F. Introdução a pesquisas de sons não nativos. In: KUPSKE, F.; ALVES, U.; LIMA JR., R. (org.). Investigando os sons de línguas não nativas: uma introdução. Campinas: Editora da Abralin, 2021. p. 15-40.

LISKER, L.; ABRAMSON, A. A cross-language study of voicing in initial stops: Acoustical measurements. Word, [S. l.], v. 20, n. 3, p. 384-422, 1964. DOI: https://doi.org/10.1080/00437956.1964.11659830

MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: Cortez, 2011.

MORIN, E. Introdução ao pensamento complexo. São Paulo: Sulina, 2015.

PEROZZO, R. Sobre as esferas cognitiva, acústico-articulatória e realista indireta da percepção fônica não-nativa: Para além do PAM-L2. 2017. 225 f. Tese (Doutorado em Estudos da Linguagem) — Instituto de Letras, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2017.

PEROZZO, R.; KUPSKE, F. Speech perception and production as constructs of action: Implications for models of L2 development. Revista X, [S. l.], v. 16, n. 5, p. 1231-1257, 2021. DOI: https://doi.org/10.5380/rvx.v16i5.81296

PIERREHUMBERT, J. Exemplar dynamics: Word frequency, lenition, and contrast. In: BYBEE, J.; HOPPER, H. (org.). Frequency effects and the emergence of lexical structure. Amsterdã: John Benjamins, 2001. p. 137-157. DOI: https://doi.org/10.1075/tsl.45.08pie

PIERREHUMBERT, J. Probabilistic Phonology: Discrimination and Robustness. In: BOD, R.; HAY, J.; JANNEDY, S. (org.). Probability Theory in Linguistics. Cambridge: MIT Press, 2003. p. 177-228.

PIERREHUMBERT, J. Phonological representation: Beyond abstract versus episodic. Annual Review of Linguistics, [S. l.], v. 2, p. 33-52, 2016. DOI: https://doi.org/10.1146/annurev-linguistics-030514-125050

PRINCE, A.; SMOLENSKY, P. Optimality theory: Constraint interaction in generative grammar. Technical Report RuCCSTR-2. [S. l.]: Rutgers Center for Cognitive Science, 1993.

RAUBER, A; RATO, A; KLUGE, D; SANTOS, G; FIGUEIREDO, M. TP: Teste de percepção (programa computacional). [S. l.]: Worken, c2009. Disponível em: www.worken. com.br/tp_regfree.php. Acesso em: 2022.

SANTOS, B. O fim do império cognitivo: a afirmação das epistemologias do sul. Belo Horizonte: Autêntica, 2019.

SAUSSURE, F. Curso de Linguística Geral. São Paulo: Cultrix, 2006.

SILVA, J.; CARDOSO, R.; KUPSKE, F. Desenvolvimento linguístico e diferenças individuais: uma discussão dinâmico complexa sobre a generalização de dados. In: ALMEIDA, A.; BATISTA, A.; KUPSKE, F. F.; ZOGHBI, D. (org.). Língua em movimento: Estudos em linguagem e interação. Salvador: EDUFBA, 2020. p. 309-326.

STEWART, I. Em busca do infinito: uma história da matemática dos primeiros números à teoria do caos. Rio de Janeiro: Zahar, 2014.

TRUBETSKOY, N. Principes de phonologie. Paris: Klincksieck, 1949.

UBEROI, J. Science and Culture. Delhi: Oxford University Press, 1978.

Downloads

Publicado

2022-12-20

Como Citar

Perozzo, R. V., & Kupske, F. F. (2022). Do berço colonial à dinâmica não linear: O despertar da percepção da fala nos estudos em fonologia. Letrônica, 15(1), e42641. https://doi.org/10.15448/1984-4301.2022.1.42641

Edição

Seção

Fonologia e Interfaces